quarta-feira, 15 de julho de 2009

Cruel incerteza






Já estávamos no fim do expediente quando peguei minha pasta para ir embora, mas Samuel e Anderson não me deixaram sair. É que a turma lá da repartição, um bando de advogados em busca de diversão para uma sexta-feira tumultuada no escritório resolveu me levar para uma boate no centro da cidade. Falei que não gostava e boates e que preferia tomar um chopinho no boteco da esquina, mas eles insistiram e não tive opção. Lá fomos nós para um inferninho com o nome de "Gandaia". Logo na entrada me espantei com os tipos que entravam e saiam, abraçados com mulheres, pelo menos era o que parecia. Samuel me tranquilizou dizendo que nem todos eram obrigados a sair com as mulheres, me relembrando que estávamos alí para apenas uma curtição e só iríamos beber e dançar, além de dar boas risadas. Lá pelas dez eu já estava sem o paletó e nem sabia onde havia ido parar a minha gravata, já estava alegre e sorridente e sem largar o copo por um minuto, o qual Samuel fazia questão de não deixá-lo vazio. Meio tonto, mas ainda enxergando bem, avistei uma morena de parar o trânsito, ou melhor, a boate. Era uma dessas gatas que a gente nunca esquece. Pernas longas e grossas, coxas carnudas e um quadril fenomenal. A gata dançava uma dança extremamente sensual e me deixava louco só de olhar aquela cinturinha girando e girando e me trazendo ao total desatino. Já não era dono de meus desejos e fui em direção àquela mulher maravilhosa, mas senti que algo me segurou pelo braço e me puxou e nesse momento pude ouvir a voz de Samuel dizendo para não fazer isso, ou teria que levar a gata comigo. Era assim que funcionava o negócio, o homem escolhia a mulher do show e a puxava do palco e os dois passavam a noite juntos. E eu na maior inocência, pretendia apenas dar uns apertões naquelas coxas. Samuel não parava de gozar da minha cara e Anderson o acompanhava dando altas gargalhadas e os dois me perguntaram se eu não havia reparado em nada diferente e eu nem imaginando o que eles estavam falando, beberiquei mais um gole de cerveja. Os dois chegaram mais perto e falaram para eu ter mais cuidado e continuavam com as gargalhadas. Resolvi desconsiderar a gozação e cheguei mais perto da moça, com uma vontade imensa de tocá-la. Era a mulher mais linda do lugar e quando me viu fitando seu olhar abaixou-se e segurou a minha mão. Naquele momento eu gelei, imaginando que teria de sair com ela e eu já estava muito alcolizado, praticamente em estado de graça e jamais daria conta daquilo tudo naquela situação em que eu me encontrava. Percebi que ela não pretendia deixar o palco e apenas abaixou-se e me beijou a boca e o beijo não era de mentira, era molhado e sensual. Apaixonei-me perdidamente naquele momento e ela disse baixinho no meu ouvido para que eu a esperasse no final do show, colocando um papel em minhas mãos e voltou para o palco. Abri o bilhete e havia um número de telefone com o nome "Fabíola" escrito atrás. Todos me olhavam sorridentes e imaginei que gostariam de estar no meu lugar, mas senti um peso em minhas costas e logo vieram Samuel e Anderson me puxando para fora daquele lugar. Mostrei a eles o papel e me arrancaram da boate sob altíssimas gargalhadas e quando entramos no carro eles me contaram que aquela era uma boate de travestis e certamente levaria um baita susto se saísse com a tal gata dalí. Segundo eles, Fabíola se tratava de um homem e não uma mulher. Comecei a contradizê-los de que ela não era homem e eles afirmavam que sim. E disseram, em meio a enormes gargalhadas, que eu estava devendo essa para eles, afinal eles haviam me salvado de um verdadeiro desastre. Disse a eles que tinha certeza de que estavam enganados, mas eles nem ouviram, pois não conseguiam parar de rir. Naquele dia eu entrei em casa e me joguei na cama sem tirar os sapatos e dormi como uma criança, tão profundamente que sonhei com aquela linda mulher, Fabíola me beijando e me dizendo que eu era o máximo, mas meus amigos deviam ter mesmo razão. Aquela devia ser mesmo uma boate de travestis e eu teria me dado muito mal se tivesse saído com aquele traveco. Acordei e encontrei o tal bilhete no bolso da calça, joguei-o no sanitário.
Com a cara amassada, deu descarga e entrou no chuveiro, lembrando daquela noite em que pela primeira vez havia escolhido alguém, não o contrário. Ouviu o toque do telefone e logo depois uma leve batida na porta do banheiro. Em seguida sua mãe gritou: "É pra você Fabíola. Não se demore meu bem, o café já está na mesa e vai esfriar... você chegou muito tarde da boate ontem, isso não é emprego pra você, filha...

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